Rastilho de Fogueira
O ocaso já se anuncia, e com ele chega o medo de
mãos dadas com a ansiedade, um longo vazio sideral se forma em meu peito, a
palidez labial se faz presente em companhia de uma secura oral que me deixa em
um estado de afiliação, mas ainda não se esvaiu o meu estado de consciência,
apesar de permanecer pávido naquele ambiente tão familiar, de onde estou
visualizo uma janela voltada para a rua e com um olhar adentro a casa através
de um corredor, penso em levantar e chegar até a janela para contemplar o que
se passa lá fora... Mas o meu receio é maior que o desejo, já o atrevimento me
seduz, porém, pede cautela e um pouco de parcimônia para seguir em frente.
Enfim realizo o meu tento, de pronto já sinto uma
corrente fria adentrar o recinto através da janela, e na minha inalação noto a
ausência de algo diferente naquele instante, falo dos cheios das fumaças
intercaladas da queima das fogueiras, dos fogos de artifícios, das pamonhas,
das canjicas e do milho em pleno cozimento.
Neste momento em um start de curiosidade olho para
o lado de fora da casa e vejo que tem algo diferente, pois é noite de São João!
Pergunto em silencio ao vento, o que aconteceu, e a
única reposta que me chega é a mais silenciosa ainda.
Diante de meu estado de choque e depois de muito
pensar, corro até o quarto em um tempo e distância de uma maratona, coisa que
outrora fazia em oito passos, paro na porta e começo em uma teima reinante se
visto ou não visto a minha roupa de gala junina, como meio de me achar, mas o
meu subconsciente é mais contundente e apenas diz não!
Saio a passos largos em busca da rua, e logo me deparo com a mais cruel das verdades que nem o
apocalipse seria capaz de anunciar, o quadro era desolador, o breu da noite se
alastrava em uma dimensão jamais vista, não tenha e nem existia quaisquer
vestígio de festa junina naquele lugar, nenhum viés de celebração a consagrada
festa da colheita.
Entro em êxtase em busca de uma resposta ou de
repostas ao que aconteceu, mas no meu âmago havia todas, apenas imperava a não
aceitação da influência de um vírus que ganhou corpo e forma e se transformou
em uma pandemia.
Não me dando como vencido, passo a percorrer
as velhas trilhas que tracejei em meu tempo de menino e morador daqui lugar, e
com certeza logo percebo que tudo realmente está diferente, inclusive a mais
brutal ausência de nossas tradições culturais e nem um simples rastilho de
cinzas de uma simplória fogueira encontro em meu caminho em um tempo que para
muitos é único e tem amarras voltadas para as suas origens e raízes e que só
nós povo do Nordeste temos!
Há noite adentra em um silencio quase sepulcral, e
nada mais a sua frente existia a não ser um infinito vazio, como a obra do
Criador é perfeita, o crepúsculo logo me presenteia com os seus raios reluzentes
de um majestoso sol e com eles trás um novo enunciado em que dias melhores
se farão presentes, na vida tudo é passageiro, pois o que deixamos de comemorar
hoje é em razão de um causa nobre que é a preservação da vida e o respeito pelo
próximo, mais tão logo estaremos todos reunidos diante de uma grande fogueira,
entorno de uma mesa farta e ao som do mestre Gonzaga, brindaremos a nossa maior
conquista que é a vida!
Viva São João!
Flauberto Wagner de Farias Fonseca
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