quarta-feira, 9 de fevereiro de 2022

A triste despedida, por Flauberto Fonseca


A feira livre de Cuité sempre foi um atrativo diferenciado em toda a região, pois começava às quatro da manhã e só terminava as dezenove horas e era tida como a maior entre os municípios em seu entorno.

Os mais antigos sempre reportavam que ela se iniciou lá nos idos do ano de 1925 e era apenas uma junção de pequenos comerciantes e agricultores locais coma única intenção de vender a sua própria produção e/ou fazer escambo entre os nativos.

Já outros sempre diziam que o ápice de nossa feira livre veio acontecer em razão da construção do Mercado das Três Portas este que ficava no encontro de três ruas, fato acontecido nos anos quarenta e que deu um relevante impulso no comercio local.

Já nos idos dos anos sessenta a mesma foi dividida em dois segmentos ficando a feira de secos e molhados no novo mercado e feiras e outros produtos no largo no velho mercado.

Desde que me entendo de gente a nossa tradicional feira livre sempre era nas segundas-feiras e em algumas situações e datas especiais acontecia nos sábados e em raríssimos casos nas terças-feiras, sendo importante frisar que fora da sua data fixa o movimento caia quase que pela metade.

Além do mais talvez fosse a única feira livre que reunia feirantes e negociantes de vários lugares no estado e também do vizinho estado do Rio Grande do Norte, sendo por um longo período o maior ponto de encontro de comerciantes do brejeiro fora de lá.

Em função de ser um importante centro comercial e suas áreas externas confinadas em determinado espaço era possível se ter um grande aproveito diante da circulação das pessoas.

Como havia uma proveitosa movimentação de dinheiro, também existia a massiva presença de pedintes em toda a sua extensão, com destaque para alguns nativos e outros tantos oriundos de outros lugares, tendo com destaque aquele que ficou e se tornou o mais conhecido entre nós.

Estou falando de Mané Cego que era brejeiro de origem e depois se tornou cuiteense por aceitação espontânea dos comunitários, que chegava aqui trazido pelos feirantes de frutas e verduras que vinham do brejo, que começavam na feira de Picuí (sábado), Nova Floresta (domingo) e encerravam em Cuité (segunda-feira).

Sendo que com o passar do tempo foi ficando se não estou errado fixou primeiro residência em Nova Floresta e depois passou a morar na antiga Rua do Louro (atual 25 de Janeiro), com a sua presença entre nós logo ele como era muito esperto passou a conhecer porta em porta e as vozes de seus moradores feito que muito contribuiu para a sua própria sobrevivência.

Para ele nunca faltou uma roupa usada ou nova pois sempre tenha alguém com certa generosidade para lhe ofertar, só não recebia sapatos, sandálias ou chinelos em razão de só andar de pés descalços, já em tempos das festas natalina, chegavam a ganhar muitos presentes, cédulas e moedas não deixando de citar as bandas de latas (embalagem de queijo do reino), como também em tempo nenhum deixou de resmungar em voz alta que “comeram o queijo e Manezinho ficou apenas com o cheiro nas mãos”.

Como passar ficou doente e por orientação de Dr. Medeiros, foi aconselhado ter uma pessoa pra cuidar dele, inclusive duas de suas irmãs estiveram por várias na cidade na intenção de levar ele de voltar para Solânea, mas sempre havia muita resistência por parte dele, mas o seu quadro de saúde ficou irreversível.

Quando chegou o dia de sua mudança se não estou fazendo confusão nas minhas ideias o meu pai que tenha um Jipe foi contratado para deixá-lo juntamente com as suas irmãs em Solânea, e talvez tenho sido para o meu pai uma das mais difíceis e penosa viagem em razão de todo lado emocional que envolvia o seu principal passageiro.

Edifico uma linha de pensamento como ele aí aceitar se despedir daquele torrão que lhe acolheu e por ele foi adotado como fosse o seu berço natal, aí se encontrava o seu inconformismo e seu estado de recusa em voltar de onde veio.

Agora diante de sua presença entre nós e apesar de sua deficiência visual era cativante e outras vezes meio ranzinza principalmente quando tomava umas bicadas a mais.

Sempre tive a maior curiosidade em saber o seu nome de batismo e sua data de nascimento, pois em particular acredito que quase ninguém entre nós tenha essa informação com precisão.

Assim, foi o início e meio de sua convivência entre nós com um fim revestido de uma triste despedida de um marcante e simples cidadão que era conhecido por todos nós e atendia pelo nome de Mané Cego.


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