Depois de ter apresentado Jesus (cf. Mt 1,1-4,22), de ter mostrado Jesus anunciando o “Reino” em palavras e em obras (cf. Mt 4,23-9,35) o evangelista Mateus descreve a preocupação de Jesus com a Messe, o chamado dos Doze e o envio em missão (cf. Mt 9,36-11,1).
O envio dos discípulos nasce desse olhar do Jovem de Nazaré da Galiléia sobre as pessoas em suas necessidades mais concretas. Essa é a autêntica pedagogia e identidade visual da espiritualidade pastoral e missionária: “ver e ter compaixão” (v. 36), para que se possa agir e celebrar. A observação das multidões cansadas e abatidas permitiu a Jesus constatar a vastidão do trabalho evangelizador a ser levado a sério.
No olhar e nas palavras de Jesus Israel é uma comunidade abatida e desnorteada, cujos líderes se demitiram das suas responsabilidades. Eram pessoas extremamente zelosas nas coisas rituais, nos sacrifícios, nos preceitos, na burocracia institucional, na captação de recursos para o templo, mas se tornaram maus pastores de que falavam os profetas (cf. Ez 34; Zc 10,2).
Frente ao descaso do abandono do povo, a primeira atitude de Jesus é a conVOCAÇÃO daqueles que Ele mesmo desejou (cf. Mc 13, 3) para que, com Ele, conduza o rebanho para lugares tranquilos e repousantes (salmo 23 (22)).
Jesus não se rodeia de pessoas que Lhe sejam serviçais (como nas cortes), mas chama seus seguidores para um trabalho que exige “a arte de cuidar bem das pessoas”. São estes “operários” que terão a missão de cuidar do rebanho em suas necessidades espirituais e materiais, porém, para que a missão seja legitima é fundamental aprender a olhar para o mundo não mais com “o senso de justiça” dos Mestres da Lei, os Escribas, os Fariseus (os interpretes da Antiga Aliança), mas como Jesus olhou (cf. Mt 5, 27-28).
A capacitação dos convocados passa, necessariamente, pela pedagogia da compaixão, da empatia, da formação continua de um olhar e um coração mais humano. A resposta para essa convocação, por parte do vocacionado, é a abertura de toda a sua vida para que seu processo de formação seja a total identificação com Jesus (cf. Gl 2, 20. 4,19).
A missão dos discípulos é, pois, lutar contra tudo aquilo (seja de carácter físico, psíquico, espiritual e social/politico) que destrói a vida, a dignidade e a felicidade do homem; que o impede de ser livre, de crescer, ampliar suas possibilidades de vida e expandir sua personalidade.
No processo de evangelização, existe um trabalho propedêutico, independente da ação do evangelizador. É a ação divina no coração humano, predispondo-o para acolher a mensagem do Reino de Deus. Sem este trabalho prévio, fica inviabilizada qualquer tentativa de fazer o Reino frutificar na vida de quem escuta a Palavra.
Como cenário de fundo desta catequese sobre o envio dos discípulos está o amor e a solicitude de Deus pelo seu Povo.
Assim como Jesus, a igreja deve ter a consciência de que sua missão não se trata apenas de uma visão religiosa do ser humano, mas ter uma visão holística que seja capaz de enxergar a integridade das idiossincrasias e das vicissitudes do homem.
Na Enciclica Populorum Progressio (13), de São Paulo VI, faz ecoar uma expressão magna que descreve a ação da Igreja no mundo: “A Igreja é perita em humanidades”.
Observem que o termo humanidades está no plural e pode indicar fatores e processos subjetivos, sociais e históricos muito mais amplos que exige dos seus pastores (e do próprio rebanho) aprender a olhar as pessoas de um modo novo, para tanto eles precisam passar pela escola do coração amoroso e do olhar cheio compaixão de Jesus.
Em sua primeira encíclica Redenptor Hominis (8), são João Paulo II exorta e relembra aquilo que disse a Sagrada Escritura, sobre a encarnação do Verbo de Deus, que “Jesus é o Redentor do mundo” (das realidades visíveis), marcado pelo pecado. E que a sociedade moderna, marcada pela forte tendência de um viver para si mesmo, precisa redescobrir a mensagem do amor, algo que ele (humano) não pode viver sem (10).
O papa Bento XVI, na Enciclica Caritas et Veitatis (30), falando aos homens e mulheres de nosso tempo (desta civilização dos avanços da tecnologia, da ciência, da comunicação..) que “as exigências do amor não contradizem aos da razão”. Portanto, é preciso aquela mesma visão holística de Jesus que conseguia integrar as coisas para compreender melhor os anseios de felicidade, de existência, de vida plena para todos.
Na esteira do Concilio Vaticano II e de seus predecessores está o papa Francisco que ao fazer um louvor ao Deus Criador (Louvado sejas, meu Senhor) exorta aos cristãos e aos homens e mulheres de boa vontade a se unirem na causa da fraternidade, diálogo, amizade social, em vista do bem comum (Fratelli Tutti).
O papa Francisco procura agir a partir daquela mesma exortação de Jesus quando viu um povo cansado e oprimido, sem esperança, sem uma justiça social equitativa e as ameaças de degradação da Casa Comum (Laudato Si, 13).
É urgente falar de Deus no mundo de hoje, mas falar como Jesus falou. Não nos convertem mensagens e pregações impressionistas que não nos levam as mesmas preocupações que Jesus tinha e ainda tem.
Rezemos para que o Senhor da Messe nos ensine a ter um coração semelhante ao Dele e ver o mundo como Ele conseguia enxergar: cheio de compaixão.
Boa semana e bons Festejos Juninos!
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