segunda-feira, 17 de julho de 2023

Padre Edjamir Sousa Silva: Por que Jesus falava em parábolas?

 


No evangelho de domingo passado (Mt 11, 25-30) ouvíamos que Jesus surpreendeu a todos ao agradecer a Deus por seu sucesso com o povo simples da Galiléia (que almejava vida e libertação) e por seu fracasso entre os mestres da lei, escribas e sacerdotes (perversos doutrinadores): “Eu te agradeço, Pai… porque escondeste estas coisas dos sábios e prudentes e as revelaste aos simples.” (Mt 11, 25s).

Se agrada ao Pai revelar-se aos pequenos e dificultar a compreensão aos orgulhosos, apraz também ao Filho a mesma metodologia.

Ao povo simples Jesus revelava os Mistérios do Reino, mas as autoridades religiosas (com sua presunção de manipular Deus de modo a oprimir o povo) ou mesmo as pessoas que não demonstravam interesse algum pela Boa Nova (gente abstrata que só busca milagres), o Senhor não detalhava os Mistérios deixando-os na ignorância da superficialidade.

É nesse contexto que entendemos a pergunta dos discípulos: “Por que falas ao povo em parábolas?” (v.10).

O Salmo 48 (49) foi muito bem incorporado no jeito de ser e na pregação de Jesus, e faz consonância com o texto de hoje. Vejamos: “Ouvi isto povos todos do universo (…); poderosos e humildes, escutai-me, ricos e pobres todos juntos, sede atentos!” (v.v.2-3). E continua: “Inclinando meus ouvidos às parábolas, decifrarei (…) o enigma” (v. 5).

O cristianismo não é uma religião do ocultismo, mesmo no enigma das parábolas, mas é revelação aos simples e humildes e confusão aos grandes e entendidos. Os Mistérios do Reino são anunciados por Jesus na sabedoria do Espirito (cf Rm 8, 9. 11-13). O orgulhoso e o presunçoso – enraizados nas obras da carne, não compreendem, pois estão enrijecidos. Mas no que eles estão enraizados? Continuemos decifrando as semelhanças entre a Parábola de hoje e o Salmo 48(49).

Jesus diz que o Semeador (que é Ele, mas pode ser também seus colaboradores) trabalhou semeando em terrenos (pessoas) de diferentes condições e situações.

A primeira remessa das sementes Jesus disse que “os pássaros vieram e comeram” (Mt 13, 4), Ele quis dizer que “pessoas não compreenderam” (v. 19) por serem “insensíveis de coração a qualquer causa que o Reino apontar, isso desde os profetas” (v. 15a). Eles se fecharam ao clamor do povo, a qualquer novidade do Reino e tinham má vontade/má fé (v. 15b). Jesus atribui isso a obra do Maligno que deixa as pessoas insensíveis às questões humanas, não tem caridade e vivem aquele tipo de ignorância obscurantista que não gera compromisso com a ética do Reino (a liberdade, a misericórdia, a justiça).

A segunda remessa das sementes Jesus disse que “elas caíram em terreno pedregoso” (v. 16). Estes são dados a uma alegria superficial, são pessoas de momento (sem compromisso com o Reino) e diante da hostilidade dos grandes deste mundo, desistem logo. Não resignificam, apenas desistem.

O salmo 48 (49) diz: “por que temer os dias maus e infelizes, quando a malicia dos perversos me circundam? Por que temer os que confiam nas riquezas e se gloriam na abundancia de seus bens?” (v. 7).

Os pobres e os excluídos não devem temer e nem reverência subalterna aos grandes, aos ricos e poderosos perversos (cf. Mt 23, 8. 9. 10), não é uma militância odiosa: “entre vos não deve ser assim” (Mt 20, 26), mas seguir Jesus com coragem e autenticidade.

As comunidades cristãs que acolhem a semente da palavra devem melhor discernir o caminho eclesial para não confundir carisma e poder com os mesmos esquemas do mundo hostil; caso contrário, a vida pastoral se torna elitista, secundária, carreirista e superficial.

A terceira remessa das sementes Jesus disse que “elas caíram nos espinhos” (v. 22), mas a preocupação com empreendedorismo destrutivo, o desejo dominante pelas riquezas, “sufocaram a Palavra” (v. 22). A verdade é que muitas pessoas não conseguem seguir Jesus, mesmo estando dentro de igrejas e até ocupando “altos cargos” por que estão sufocadas e já nem se dão conta disso. Não são pessoas leves.

É triste ouvir do povo simples (de um catador): “naquela igreja só vão os ricos, eles não se misturam com os pobres”. São comunidades sufocadas onde a Palavra não consegue enraizar e produzir frutos: “Pois a criação ficou sujeita à vaidade, não por sua livre vontade, mas por sua dependência daquele que a sujeitou” (Rm 8, 20).

O salmo 48 (49) diz: “Ninguém se livra de sua morte por dinheiro, nem a Deus pode pagar (…), nem dar-lhe uma existência imortal (…). Felicitava-se a si mesmo enquanto vivo: “todos te aplaudem, tudo bem, isso é que vida! Mas vai-se ele para junto de seus pais que nunca mais e nunca mais verão a luz!”(v.v. 8. 10. 19 20. 21). Ele é tão iludido no seu empreendedorismo egoísta que, segundo Jesus, não dá fruto para o Reino (Mt 13, 22).

Essa terceira remessa nos provoca um exame de consciência, mas também uma reclamação profética e evangélica a perceber se o cristianismo atual está nas mãos de grupos aristocratas burgueses (de uma teologia da prosperidade/capitalista/meritocrata), aliados a mercenários que se apropriam da religião e se tornam fardos pesados ao povo simples e excluído.

A história já fez essa denuncia e a vigilância evangélica deve ser perene. Não deixemos morrer a profecia: “Ele derruba os poderosos de seus tronos e eleva os humildes” (cf Lc 1, 52)

Ninguém se engane, Jesus continua a anunciar o Reino de Deus revelando-se aos excluídos, mas tornando-se confusão na cabeça dos egoístas. Enquanto os grandes massacram a liberdade e dignidade dos pequenos, Deus os considera “como terra boa” (cf. Mt 13, 23),

As sementes do Reino não se confundem com uma doutrinação abstrata sem compromisso com os pobres. As sementes do Reino não se confundem com as ideologias de exclusão (teologias refinadas com intensão de segregar). Jesus denunciou a superficialidade de muita gente que o segue dessa maneira.

Não deixemos que o diabo nos roube as sementes do Reino e nem as preocupações do mundo nos sufoquem.


Paraibaonline

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