Palavra do Senhor –
“Que crime ele cometeu?”
A entrada de Jesus em Jerusalém cumpre a profecia de Zacarias a respeito do
Messias: “Seu rei está chegando, justo e vitorioso. Ele é pobre, vem montado
num jumento [...]. Ele anuncia a paz a todas as nações (Zc 9, 9-10).
Os
que o acompanham não trazem consigo armas, mas ramos (que lembram a Aliança).
Não eram filactérios (paninhos com trechos das escrituras) espalhados pelo
chão, mas seus mantos (aquilo que era próprio de seu cotidiano). O Messias
chegou.
A
igreja, desde cedo, introduziu essa passagem do evangelho nos seus atos
litúrgicos, abrindo a Semana Santa, mas não quis se perder na simbologia e
teatralidade, quis nos levar ao real: Um rei justo, pobre, que anuncia a paz.
Desde
Nazaré, este rei justo e pobre vem anunciando a paz. E como a paz é fruto da
justiça/amor ela causa desconfortos (cf. Isaias 32, 17. Mt 5, 9. 13. Tg 3, 18.
São Tomas. Suma Teológica. Vol II. p275).
Em
meio a esse caminho Jesus recebe um titulo e, talvez, um dos mais bonitos, que
lhe fora dado pelos seus adversários: “Ele é amigo dos pecadores, meretrizes e
publicanos” (cf. Lc 15, 1-2. Mt 9, 11).
Pelos
caminhos da Galileia, andava Jesus com muitas pessoas que, religiosos e
Herodianos, chamam de gentinha, de pobretões, sem classe, sem estilo, sem a
estética da moda. Podemos imaginar o quanto o Filho de Deus foi feliz ao lado
desses seus amigos: sorria, festejava, cantavam, dançavam, rezam juntos,
falavam sobre a vida, etc (recordo aqui os episódios de The Chosen).
Em
meio aos seus amigos, Jesus não era um supremacista, falava de um Deus amoroso
e misericordioso, não vivia a lhes dar aulinhas de catecismo moralista (como
faziam os fariseus e Mestres da Lei), mas ao contrário, os colocava como
protagonistas do Reino de Deus (cf Mt 5. 21, 31).
JESUS
É AMIGO DE PESSOAS QUE TEM MÁ FAMA: É UMA PERSONA NON GRATA e, ainda, se diz
ser Filho de Deus, questiona a rigidez da lei, diz que destruirá o templo, que
é maior que Abraão... Sua história de vida (suas escolhas e valores) vai dando
matéria de tantas acusações, fofocas, julgamentos por parte de pessoas que são
tidas como pessoas de bem, piedosas, honestas. Mas, a lógica do evangelho reduz
todos esses esquemas ao pó da mera vaidade e hipocrisia.
Conta-nos
o evangelho de João: “Pilatos foi ao encontro dos Judeus e lhes disse ‘nenhuma culpa
encontro nele! (...) Eis que vo-lo trago aqui fora para saberdes que não
encontro motivo algum de condenação...eu não encontro culpa nele! Pilatos
procura liberta-lo’” (Jo 18, 38ss).
“Que
crime ele cometeu?” A narrativa da Paixão, em João, diz: “Se o soltas, não és
amigo de César...NÃO TEMOS OUTRO REI A NÃO SER CESAR!” (JO 19, 12-15) e
conforme a lei, ele deve morrer, por que se fez Filho de Deus” (Jo 19, 7). Uma
razão politica e uma razão religiosa.
Os
evangelistas lembram que Jesus “subverte o povo ensinando por toda a Galileia”
(Lc 23,5). Os ensinamentos de Jesus, que tem no centro a fraternidade: “vos
sois todos irmãos” (Cf Mt 23, 8) causam desconforto: “Se deixarmos esse homem
agindo assim, todos vão crer nele e os romanos virão e destruirão o templo e a
nação” (Jo 11, 48-50).
Os
motivos religiosos eram sempre mais acentuados com as intrigas das lideranças
do Sinédrio contra Jesus que, segundo eles, viva a dizer blasfêmias: “NÓS
QUEREMOS APEDREJAR-TE, não por causa de alguma boa obra, mas por blasfêmia,
pois sendo homem tu te fazes Deus” (Jo 10, 33).
São
Mateus, diante das discursões dentro do Sinédrio, lembra o que o Sumo Sacerdote
interpelou: “És tu o Messias, Filho de Deus?”. E Jesus respondeu: “Exatamente
como dizes!” (Mt 26, 63-64). E a sentença lhe foi dada: condenado por um jogo
politico de subversão e, por blasfêmia. No âmago da questão está “o amigo dos
pobres e pecadores” que incomoda aqueles que se julgam serem homens de bem.
Dom Luiz Gonzaga Fernandes (in memoriam), em sua
pregação sobre a morte de Jesus (em 27/03/1988) disse: “Assim, através dos
tempos, este mesmo Cristo em seus discípulos fiéis e em sua igreja, continuará
sob as incompreensões de todos os poderes do mundo e guardiões do templo. O
evangelho subverte sempre a ordem estabelecida e põe em crise as “religiões” de
estado. Herodianos e Levitas se articulam contra a proposta do Nazareno, em
busca de um homem novo e uma nova sociedade. Por isso, ele deve morrer!”
O
Sinédrio condenou Jesus à morte por que Ele, amigos dos pecadores, representava
uma blasfêmia e uma vergonha para a fé daqueles “homens de bem”. Eles não são
anunciadores da fé, mas de moralidades, de legalismo, de liturgias cheias de
pompas, criminalidades e sem Deus. Eles foram capazes de excluir e matar quem
pregasse o “evangelho da inclusão”.
Convém
perguntar aos cristãos de nosso tempo se há alguma sombra de evangelho em
nossos grupos e esquemas de pastorais? Se Jesus está presente no modo como Ele
foi (amigos dos pecadores) ou estamos a inventar um Cristo para adequar-se aos
esquemas humanos que vive a usar a religião e a politica para condenar as
pessoas?
Boa
Semana Santa!
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