Na liturgia dominical deste ano
estamos lendo o Evangelho de Marcos. Recordamos que domingo passado, no
evangelho, “Jesus viu uma numerosa multidão e teve compaixão, porque eram como
ovelhas sem pastor” (cf. Mc 6, 30-34). Em Mateus (9, 36-38) a cena da compaixão
de Jesus é descrita por ver o povo aflito, desamparado, no submundo de uma dura
existência.
Hoje acompanharemos Jesus no
Evangelho de João Jo 6,1-15 numa ampliada catequese eucarística e o sinal
concreto do “pão da vida”. É uma catequese ampliada da narrativa dos pães do
evangelho de Marcos.
A cena se desloca de Jerusalém para
as periferias da Galiléia (Jo 6, 1). E como em Marcos (6,33-34), uma multidão
vai atrás dele.
O texto ainda nos diz uma coisa
interessante: “estava próxima a festa da Páscoa dos judeus” (Jo 6, 4). Era
comum que as pessoas subissem a cidade de Jerusalém para as celebrações da
festa da libertação (Memória da saída do Egito). Agora, o povo estava indo ao
encontro do novo Moisés (Jesus) que com seus sinais de libertação
(eucarísticos) trazia vida para todos (compaixão, misericórdia, compreensão, partilha,
perdão, leveza dos fardos, vida digna para todos...).
O povo tem
fome. Eles estão diante do impasse de alimentar
numerosa multidão com tão pouco. Jesus sabe o que quer e como vai agir. Ele toma a iniciativa
mesmo sabendo como ia resolver.
Filipe tem a mesma atitude do servo
do profeta Eliseu (2Rs 4,21-44). Ele também acreditava que para partilhar é
preciso antes acumular e logo fez um calculo de quanto deveria gastar e pensa
que duzentos denários não bastam para que cada um receba um pouco de pão (um
denário parece ser a diária de um lavrador: (cf Mc 6, 38. Mt 20,2).
O discípulo André, ainda que meio
tímido, arrisca em dizer que há um menino com cinco pães de cevada e dois
peixinhos (Jo 6, 9), mas também não acredita que a partilha resolva.. João
apresenta esse personagem com pães e peixes para recordar Eliseu.
Como numa mesa Jesus senta e pede
para que eles também sentem. O Filho de Deus senta à mesa com os pobres. Ele toma
os pães e, dizendo a ação de graças (em grego: eucharistia), distribui. Faz o
mesmo com os peixinhos. Os gestos e as palavras usados são os mesmos da celebração
dos primeiros cristãos como testemunho do que eles aprenderam de Jesus. É a nova Páscoa.
Na perspectiva da cristologia
joanina o que Jesus faz vem do alto e supera a ideologia mundana do mercado do ter
muito dinheiro para fazer alguma coisa. A Sabedoria do alto chama os discípulos
para partilhar. Jesus se levanta e vai servi-los. Ele é o provedor que ensina
com gestos eucarísticos como matar a fome do povo.
Nesse clima eucarístico/partilha,
“vendo o sinal que Jesus tinha realizado” (Jo 6, 14) o povo “queria proclamá-lo
rei” (v. 15). Imaginemos que Jesus já estivesse até ouvindo gritos e brados de
“Viva a Jesus Rei! Ele impera!”, mas a boa modéstia de Jesus não admitiu/nem
admite esses alvoroços. Ele simplesmente sai de cena (v. 15) para não alimentar
uma imagem errônea dele e nem despertar a insanidade do desejo do poder entre
os seus mais próximos colaboradores (cf. Mt 20, 20-23). Com esses contravalores, Jesus sempre sai de cena.
Com gestos de misericórdia e
compaixão Jesus concretiza a esperança do Povo de Israel. Este é o sinal
concreto na vida de quem celebra a eucaristia. O carinho e atenção para com os
mais pobres, a libertação dos oprimidos, a luta pela dignidade humana...o sair
dos círculos de poderes insanos para servir sem interesses é o sentido real que
aquele Jovem de Nazaré (Jesus) deu a eucaristia.
Na segunda leitura (Efésios 4,1-6)
Paulo ainda lembra que a fé em Jesus transforma a vida dos discípulos e
comunidades seguindo os princípios cristãos: “humildade, paciência, mansidão e
amor” (v.2). Quem come do pão que é Jesus se converte num discípulo Seu e
deverá defender a vida na unidade, mesmo sabendo das diferenças que
caracterizam os membros da comunidade: “há um só corpo, um só espirito, como
também é uma só esperança a qual fomos chamados. Há uma só fé, um só Senhor
batismo, um só Deus e Pai de todos” (v.v. 4-6). Por isso, precisamos viver em
unidade vencendo as forças daquilo que exclui e divide.
Se a eucaristia que diariamente ou semanalmente
participamos e as longas e emotivas adorações ao Santíssimo não nos despertam
para sair do simbólico ao real...do “eu” ao “outro” é sinal que não estamos
entendendo Jesus.
Que a mesa da nossa casa seja bendita, que nunca falte a gratidão e a partilha. Recordemos as bonitas e justas lições de nossos antepassados que rezavam: “O pouco com Deus é o muito e o muito sem Deus é nada”.
Boa semana!
Edjamir Silva
Souza
Padre e Psicólogo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
O conteúdo do comentário é de inteira responsabilidade do leitor.