O Livro do Profeta Daniel foi escrito num período trágico. Israel viveu uma
dura opressão por parte de Antíoco IV Epifânio (dinastia selêucida / 215 a.C
215 a. C). Um homem perverso e ímpio que obrigou ao povo judeu a viver como os
pagãos (helênicos). Profanou o Templo de Jerusalém colocando bem no centro uma
estátua de Zeus: “uma abominável desolação” (cf. Dn 9-11).
Semana
passada ouvíamos uma história semelhante (1Rs 17, 10-16) quando o rei Acab (+-900 a.C) e sua esposa Jesabel (filha
do Rei de Damasco) devotos de Baal propagaram a devoção à esta divindade e
colocaram uma estátua de Baal dentro do Templo na Samaria. Naquele tempo, o
povo de Deus na Samaria inclinou seu coração ao deus da prosperidade (Baal) e
fechou seu coração em busca das riquezas do mundo.
Antíoco
IV vai mais além, pois ainda mandou queimar os livros da Lei (tão difícil de
serem reproduzidos). Ele queria que os judeus oferecessem culto aos deuses
pagãos. Nesse período, muitos judeus abandonaram a fé, por causa da pressão
contra eles. Mas, também, outros se questionavam quando surgiria um mundo novo
e o que aconteceria com aqueles que não renegaram a própria fé e foram
condenados à morte?
Para
consolar o povo, o autor resgata uma história, dos tempos de desolação com a
invasão dos Babilônicos, de três jovens que viveram no cativeiro (+- 597 a 538)
e foram levados a fornalha. A mensagem era para dizer ao povo atual que aqueles
três jovens foram fiéis (cf. Dn 3).
“Naquele
tempo se levantará Miguel” (Dn 10, 1). O nome Miguel significa “quem como
Deus?”. Ai está a chave de leitura deste texto: Deus está acima da opressão e
desolação. O juízo de Deus – na intervenção do Arcanjo Miguel – trará justiça e
consolação. Dai que, o povo entendeu que Deus não os abandonou.
Quando
lemos e relemos estes textos cheios de simbologia vamos tomando consciência de
seu sentido pleno, que vai além do sentido literário. A Igreja lê um texto que
diz “naquele tempo” (sentido literal), mas que produz consolação a todos os
filhos de Deus em todos os tempos e lugares (sentido pleno).
O
povo do texto original é de uma época (sentido literal), mas está aberto ao
sentido pleno na vida da igreja. São Gregório, magno, dizia que a Escritura
cresce com aquele que a “escuta” e “ler”. É O SENTIDO PLENO QUE VAI ALÉM DO
LITERAL.
É
importante dizer que a Palavra de Deus não é propriedade de interpretação
subjetiva, mas o Espírito dá a Palavra à Igreja: “Sabei que nenhuma profecia da
Escritura provém de intepretação pessoal, sabendo primeiramente isto (...)”
(2Pe 1, 20). É a Igreja que prega a Palavra da Profecia para ser luz a brilhar
em tempos de penúria e escuridão; por isso, é a Palavra a trazer luz: “Quem tem
ouvidos escute o que o Espírito diz à Igreja” (Ap 2, 10-11).
Vivemos
em tempos em que pessoas fazem todo o tipo de interpretação das profecias no
intuito de manipular as pessoas e gerar nelas medo e subserviência. Nas redes
sociais, quase sempre encontramos pessoas a dizer todo o tipo de bobagem tido
como revelações. Há relatos de gurus a dizer que Jesus as leva, semanalmente
(ou diariamente), ao inferno para saber quem está por lá: “meio que uma fofoca
gospel”.
É
preciso ter muito cuidado com tudo isso, pois a Palavra de Deus foi escrita
para gerar esperança no coração das pessoas e não o medo que enrijece a Boa
Nova do Reino.
“Miguel
se levantará” (Dn10, 1). Ele é o defensor dos filhos de Deus que “sofrem como
que em dores de parto” (Rm 8, 22). Vejam, as dores da vida, as perseguições, a
fome, a exclusão, a exploração...Deus assumiu para redimir no seu projeto de
amor (cf Lc 18, 7). O texto é para que os de coração bom não se cansem da
bondade diante do comportamento dos maus. Os que tiverem ensinado o caminho da
justiça, brilharão como luzes por toda a eternidade.
O texto evangélico de hoje (Mc 13,
24-25) é uma parábola para alertar
aos cristãos da necessidade da perseverança na oração e na prática do bem. A perseverança fará com que os filhos de
Deus, atravessando os dias de desolação, vejam a justiça divina acontecer.
“Quando
o Senhor voltar, encontrará fé sobre a terra?” (v. 8). Essa pergunta se
atualiza em nós (é para mim e para você). Quando olhamos à nossa volta, ficamos
com a ligeira impressão de que a humanidade está a caminho de um futuro menos
rico de fé, e cada vez mais ligado aos bens pessoais.
Os
sinais do Reino de Deus estão sempre baseados na justiça e na misericórdia (v.
8). A defesa dos pequenos é sempre um gesto profético. Mais do que curandeiros,
a igreja precisa de profetas.
“O
céu e a terra passarão, mas as minhas palavras não passará” (Mt 24,10 ). Jesus
não determina o dia e a hora do fim. Muito menos semeou esse discurso entre os
seus. E tomara que os cristãos de hoje se cansem dessas profecias catastróficas
para perceber o que Jesus está a nos dizer.
É
importantíssimo saber ler os sinais dos tempos e viver intensamente o momento
presente, como se fosse o ultimo momento, mas sem a compulsão hodierna que gera
muito mais lucro sem se comprometer com a vida e vida digna das pessoas. Os
sinais passam, mas a Palavra de Deus não.
Na carta aos Hebreus (10, 11-14. 18) o autor nos lembra do sacrifício de Cristo como
único sacrifício capaz de apagar todos os nossos pecados, coisa que os
sacerdotes da Antiga Aliança não conseguiram. A eucaristia atualiza o
sacrifício de Cristo não só no altar das nossas igrejas (quando celebramos com
tanto zelo), mas também no altar da vida de muitos que são vitimas de uma
cultura de “não vida” e “muita exploração”(sacrifícios inúteis).
No
Dia Mundial dos Pobres fiquemos atentos as lutas justas de nossos dias, em
favor dos pobres e excluídos, e nos empenhemos como Bem aventurados do Reino de
Deus: “a ter fome e sede de justiça”.
Sagrado
Coração de Jesus, temos confiança em vós!
Boa semana!
Edjamir Silva Souza
Padre e Psicólogo.
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